terça-feira, maio 22, 2007

Super librarize me

Este post tem por objectivo responder ponto por ponto a um digníssimo comentário, perdido algures neste blogue, que se manifesta preocupado com a McDonaldização das Bibliotecas…

P.G. – «Meu caro amigo:
Creio que questão que coloca é da maior importância. Sob a cláusula do depósito legal, o Estado obriga os editores a oferecerem 13 exemplares (creio que é isso) que depois são distribuídos por algumas bibliotecas privilegiadas do país…»
Bibliotecário Anarquista – Embora existam algumas vantagens na recepção do Depósito Legal, creio que a maioria das bibliotecas depositárias não se consideram especialmente “privilegiadas” por receberem o dito depósito. Existem regras muito precisas da IFLA e da UNESCO para o serviço de aquisições e gestão das colecções nas Bibliotecas McDonalds (orçamentos face à população que as bibliotecas servem, critérios de selecção, livros em línguas estrangeiras para minorias étnicas, etc…) que as ofertas, doações e depósitos legais não só passam ao lado como criam problemas muitas vezes irresolúveis, designadamente em matéria de armazenamento. Para dar um pequeníssimo exemplo as Bibliotecas Municipais de Lisboa recebem por via do Depósito Legal toda a imprensa regional portuguesa. Faz sentido?... Há dinheiro para fazer face aos custos de armazenamento de toda esta documentação?...
P.G. – «A primeira lei é dos anos '30 (se não estou em erro) e a razão para tal prendia-se também com a salvaguarda da memória da produção bibliográfica impressa. Perante a perspectiva de bombardeamentos, catástrofes, terramotos, incêndios, etc., era uma forma expedita e barata para o Estado de salvaguardar essa memória e garantir essa função patrimonial. O que o Estado não faz é garantir condições de tratamento, de acessibilidade e, mesmo, de segurança dessa produção. E deveria fazê-lo, sob pena de estar a praticar a um roubo legal sobre os autores e editores. É também importante que existam espalhados pelo país bibliotecas com "depósito legal". As bibliotecas com valência patrimonial são as que mais interessam quando se pretende não apenas consumir "leitura" mas também "produzir cultura". Assusta-me a macdonaldização das bibliotecas que, no fundo, têm os livros que se podem comprar no supermercado da esquina ou na feira do livro. A eliminação de espólios (selecção) realizada em nome de um "saber actualizado" ou em critérios mais tecnocráticos como as "taxas de utilização" ou até mais comezinhos como a falta de pessoal e de estantes, pode conduzir, por exemplo, à eliminação (física ou por simples ocultação/depósito sem tratamento documental) dos primeiros textos do Miguel Bakunine, do Kropotkine, de Malatesta, de Durruti e do Abel Paz. Ou do Max Weber e do Carlinhos Marx. Ou do António Sérgio e da quantidade de livros que se produziram sobre o cooperativismo.
B.A. – Autores interessantes, utilizados porventura para sensibilizar a alma “anarquista”… de qualquer modo as 194 bibliotecas nacionais de todos os países do mundo já têm por missão salvaguardar as respectivas memórias nacionais e em Portugal as 308 bibliotecas municipais têm também por missão (para além de macdolnadizar a leitura) salvaguardar a memória local. Por outro lado parece-me também muito provável que soma de todas as memórias locais seja igual a uma memória nacional. Ora aí está uma interessante cópia de segurança sem custos irrealistas. Quanto à Mcdonaldização das bibliotecas, fiquei especialmente ENCANTADO com o conceito no dia em que passei à porta duma e assisti incrédulo a uma monumental birra dos meus filhos e sobrinhos porque queriam… ENTRAR NA BIBLIOTECA!...
É que lá dentro existiam: escorregas, pufs, almofadonas e pessoas muito divertidas e simpáticas a contar histórias… ao contrário da Biblioteca do amigo P.G. que está fechada porque tem apenas uma bibliotecária que naquele momento está ocupada a catalogar o nº 23 456 do «Jornal do Fundão»…
P.G. – «Dizia muito do meu país se houvesse manifestações porque a biblioteca da sua terra ou região não trata nem disponibiliza os livros que lhes oferecem».
B.A. – Creio que muda imediatamente de opinião no dia em que contabilizar no seu IRS o dinheiro torrado com a DUPLICAÇÃO ineficiente de tarefas no domínio da “preservação cultural”. Tal como não acredito que no seu orçamento privado compre dois ou três exemplares de cada livro, jornal, CD ou DVD e os guarde em locais diferentes da sua casa para salvaguardar o “património” em caso de catástrofe…
P.G. – «Quanto à promoção da leitura, que parece agora ser missão das bibliotecas, iremos ver os resultados... Eu gostaria que as bibliotecas promovessem a leitura da matemática, da física, da computação, da engenharia nos seus diversos ramos, das ciências sociais e políticas. Na verdade, elas deveriam ser um recurso público gratuito que elevasse os cidadãos como criadores de cultura e não apenas como consumidores dos letrados da moda».
B. A. – Parece-me pois que a MCDonaldização das bibliotecas constitui a melhor oportunidade de sempre para os livros fazerem concorrência ao próprio… McDonalds. Os nórdicos fizeram o teste nos anos 60 (transformaram as bibliotecas em supermercados de livros e multimédia gratuitos). Os ingleses MacDonaldizaram até os seus próprios museus nacionais e… so far não se têm dado muito mal!... Até atraem turistas estrangeiros…
Na minha insignificante opinião venerar a cultura prejudica-a mais do que a sua banalização…
Abraço,Adalberto