quinta-feira, janeiro 25, 2007

A nicotina da leitura


Ilustração de Alain Corbel

Anacleto Quadrado era totalmente viciado em livros e revistas. Mal acordava a primeira coisa que fazia era ler um capitulozinho de literatura russa. Fazia-o antes mesmo de tirar o pijama e beber um copo de água. Lia em todo o lado, inclusivé em lugares proibidos como o ginásio, a igreja, a repartição de finanças, ou nos jogos de futebol. Lia descaradamente, até por baixo das placas sino sanitárias que indicavam «NÃO LER!». Por dia marchavam mais de 60 livros e publicações periódicas e lia mais de manhã do que à tarde, o que o levou a procurar auxílio médico. Consunia de tudo: contos, mitos, lendas, historietas de banda desenhada, epigramas, adágios, dissertações e até sentenças do tribunal da relação. Seus dedos e hálito tresandavam a mofo das páginas amarelecidas pelo tempo. Se ficasse mais de quinze minutos sem ler vinham-lhe logo os acessos de calor, suor, tremedeira, náuseas, diarreias, cãibras e até insónias. Inscreveu-se nos leitores anónimos: uma terapia de grupo, no entanto o livro que lhe dava mais prazer era sempre aquele que lia depois do acto sexual.
Inté!